Subiam ao veículo cerca de quarenta e
poucas pessoas, cada uma com uma característica peculiar. Os olhos ansiosos, a
boca seca e a audição apuradíssima. Subiam ao veículo, na verdade, a um que
conseguia levar e trazer muita gente, um ônibus. Era uma excursão. Para alguns,
muito esperada; para outros, nem tanto.
As pessoas se comunicavam, pareciam se
conhecer. Conversas soltas e despojadas faziam parte dos diálogos. Outros eram
calados, reservados, só observavam. Havia ainda aquele que não dizia nada pelo
simples fato de não entender o que os demais estavam falando, pois falava
inglês e alemão, viera da Alemanha. O Brasil, aliás, era bem receptivo com os
famosos gringos — assim chamados por nós —, em sua plenitude. Aqueles eram
cortejados ao extremo, como todo e bom brasileiro, a nossa hospitalidade é de
ponta, distribuímos carinho, amor e muita atenção aos estrangeiros. O engraçado
é que no país deles, nós, brasileiros, não passamos de meros comuns, sem
qualificação espiritual ou quaisquer qualidades observáveis capazes de chamar a
atenção deles por nenhum instante. Os brasileiros eram mesmo bocós.
Aboletaram-se nos aposentos estreitos
e mal confortados do ônibus. De lá até o destino foram cantorias, insônias e
desesperanças.
A maioria era composta por mulheres
lindas, algumas meigas, outras atrevidas e até sensuais. Os rapazes eram poucos,
coisa de doze no máximo. Tinham os reservados, os agitados e os aparentes.
Todos estes brasileiros. E é claro, o gringo, considerado, obviamente, o
espetáculo de homem. Loiro, olhos azuis, corpo atlético, barba por fazer,
cabelos lisos e caídos transversalmente do eixo paralelo de sua cabeça; ombros
largos, pernas peludas, excitantes. Perfeito! O homem que toda moça ou rapaz, a
depender, queria ao seu lado. Pouco falava, sentara com uma moça que nada dizia
de inglês, talvez a situação fosse desconfortante, mas mesmo assim, era muito
bom, pra ela, tê-lo do lado.
A mais de mil e quinhentos metros
acima do mar chegaram ao primeiro destino. As araucárias eram as grandes
novidades da vez. Exuberantes! A mata ombrófila mista contemplava-nos. Uma
névoa de nuvens tocavam nossos olhos de maneira única; paisagens belíssimas que
jamais seriam esquecidas.
Um montante de sensações,
brincadeiras, risadas, ou até, gargalhadas, cantorias, euforia, diversão, ou
até, esquizofrenia, enfim... reações de uma viagem, de uma trilha, de uma mata,
de uma cidade, de uma pousada. Eita! E quê contar dessa pousada?
Bom, a esperar das pessoas que ali se
encontravam, era isso o mínimo a se esperar. Um exibicionismo exacerbado, o
encanto pelo extraordinário, maravilhoso, o que deixava qualquer um em flama, o
que tudo podia, o major, a autoridade máxima, o cara dos maravilhosos olhos
azuis. Bom, sim, já sabe de quem o texto se refere, do gringo. O alemão que fez
homem descobrir sua sexualidade, mulheres bem resolvidas a se desfrutar no
desejo estrangeiro, da ganância pelo sexo mentalmente sonhado por outras, da
busca incessante pela aprendizagem da língua inglesa (a única coisa boa dessa
glorificação estrangeira, inadmissível), e o prazer carnal enraizado.
Adentrando o pensamento
majoritariamente estereotipado dos estrangeiros, o Brasil não passava de um
lugar enorme, onde todos desfrutavam do famoso futebol, além do mais, este é
considerado "O País do Futebol" (lembrando que nem as últimas copas
ele vem ganhando), somado ao carnaval enraizado à cultura brasileira. Pois bem,
o gringo da viagem nada mais teve por constatação real e persuasiva de que este
país realmente era tudo aquilo que pensava: futebol, mulher bonita, praia, sol,
carnaval, ousadia, futilidade, orgia, sexo explícito e, lógico, o famoso
"pago-pau" por tudo que vem da Europa ou de países desenvolvidos do
hemisfério norte do planeta Terra. Ridículo!
A pousada era grande, o ambiente
agradável. Frio! Sim, era Campos do Jordão, um frio intenso fazia toda noite,
novidade para os viajantes que nunca sentiram tanto pelo tempo. Jogos! Sim,
jogos ocorriam. Eram estudantes, jovens, idealizadores, sonhadores. Dormiam
tarde; era boêmia, era viver intensamente.
Numa roda estavam algumas pessoas, uma
negra, duas loiras, duas gordas, uma magra, três rapazes, estes gays e, lógico,
o gringo. Aliás, ele era o centro das atenções, podiam não notar entre si de
maneira intencional, mas ele era o centro de tudo.
A cada cinco palavras ditas, cinco
eram direcionadas ao rapaz estrangeiro. Uma das gordas dissera:
— Você é simpático!
Ruborizou. Não! Não o gringo, a gorda,
ela escarlate! Uma sem vergonha como todos que estavam ali.
— Você entende o que a gente fala? — a
magra.
— I not understand. Sorry!
— Traduz pra mim, amiga...
Após a tradução, um "so so",
ou seja, mais ou menos. Ah! Aproveitaram, já que o mesmo não entendia muita
coisa, nada melhor do que desatar nas indiretas, nas besteiras e brincadeiras
de luxúria.
O jogo seguiu neste clima, ouviam-se
barbaridades. O gringo gostava, tinha a ele todas as atenções; nunca tinha sido
tão cortejado. Que maravilha, só faltava servi-lo. O que não era de se
duvidar...
Um dos gays da roda, o olhava
incessantemente, o calor lhe subia o corpo. Em sua mente: "Nossa, que
gostoso, uma trepada e eu já estava satisfeito"... Não era somente ele que
tiveras este pensamento, o outro gay também, veja: "Será que ele é gay?
Preciso me garantir para um sim".
A negra era sensata, educada, mais
requintada. Se o desejasse não o transmitia, apenas se comunicava. De extrema
doçura, de uma delicadeza e espontaneidade, ela era uma amiga incrível, a negra
era tudo isso, mas ninguém a notava. Era motivo de algumas piadas intolerantes,
de má-intenção. O que eu digo de infeliz preconceito!
De portas fechadas, lá estava ela, a
menina moça, a alma de criança, a que possuía o sorriso mais lindo que alguém
já tinha visto. Pouco estava se importando pela presença do gringo naquela
viagem, mal queria saber ela dele, não lhe interessava, era uma pessoa normal,
o diferente nele era a fluência em outros idiomas: alemão e inglês.
Logicamente que ela não foi mal
educada à presença dele na turma da excursão, mas também, não o glorificava;
tratava-o como normal, incorporava-o ao grupo de forma natural, como se fosse
brasileiro, como se fosse parte da futilidade nada efêmera dos brasileiros.
A corrida já tinha começado há tempos!
Que corrida? Oras, a corrida pela conquista da atenção do gringo, ou quem sabe,
do coração do mesmo, ou ainda, de uma noite de sexo com ele. Enfim, a corrida
pelo gringo. Engraçado, né? Mas era a pura verdade e realidade. Todas as horas
do dia, da noite, da madrugada, de tudo, eram destinadas a ele. Se uma festinha
fosse marcada, o objetivo era sediar o "pobre coitado" do estrangeiro
que, aliás, estava gostando muito de tudo aquilo. Uma recepção calorosa e contagiante
que os brasileiros tinham, algo que causava inveja. Talvez a única coisa boa
que ele teria para contar do pessoal daqui.
Praia!
— Nunca tinha vindo em uma, que
delícia — comentou um do grupo.
— Sabe que eu mais queria agora? — uma
espoleta indagou no ar.
— O quê, amiga? — a outra já sabendo a
resposta infame.
— Que a sunga do gringo fosse embora
com as ondas do mar.
Ambas riram freneticamente, e ambas
queriam o mesmo, a outra apenas não confirmou, mas todos queriam a mesma coisa.
As gordas, as magras, as morenas, a negra, os gays... Todos!
Futilidade? Não... luxúria mesmo
enfadada com a hospitalidade receptiva por um sexo explícito e ardente.
— I have a girlfrend! — dito pelo
gringo.
Após uma conversa, foi exatamente isso
que respondeu. Posto à contraparede, enrubescido pela impertinência da
pergunta, foi dado a todos que ele era comprometido.
"Droga! Mas a namorada é alemã,
está na Alemanha, a sebe concebe uma pulada", pensou elas... "Droga,
mas ainda acho que ele pode ser gay", pensaram eles... Era para rir?... Ou
para chorar? Isso não invalidou o fato de continuarem os cortejos, os flertes.
Tudo era dito e explícito a ele, tudo
era falado e mostrado a ele. Asco! Um nojo do telespectador perante aquilo.
Como podia pessoas se dar a uma atitude ridícula como aquela? Obviamente que,
nem todos o bajulava, mas a maioria, então, entende-se que o caso era sério.
Poucos eram os sensatos.
As moças não o deixavam em paz, os
gays tampouco sabiam fazer alguma coisa sem mencionar o nome do tal gringo.
Inferno! Gritava os que nada queriam com ele. Queriam gozar com ele, queriam
transar, trepar, sei lá, o termo não importa, a intenção estava estampada.
Coitado, estava num meio de foices. Uma briga daqui outra dali, pronto para ser
o troféu, o prêmio.
Numa noite, ainda na praia, andavam o
gringo, a menina moça, a amiga número um da menina moça, um rapaz, indefinido,
insolúvel em meio sua sexualidade, uma cantora, uma poeta, mas todos biólogos.
Nesta noite, o gringo pôde fazer uma escolha, e ele fez, escolheu em meio às rochas
marinhas, que forjavam a beira da praia, sentar-se com a mais meiga, a menos
interessada e a mais linda, a menina moça. Com ela ele permaneceu. A escuridão
era ardente, os olhos já não os enxergavam, todos estavam longe, o som do mar
soava nos ouvidos, o sal respingava suas peles, a noite exibia a lua, uma lua
nem cheia, nem minguante, uma lua de encontros. Esperava-se que algo
acontecesse, mas... Se aconteceu não se sabe a resposta, pois a escuridão era
intensa; os sorrisos certos, as brincadeiras inesquecíveis, mas de concreto
nada se tinha, nada existia. Volúvel!
O bom que o gringo aprendeu que apenas
a maioria brasileira é vulgar, inepta e inata futilmente.
FIM
BY: BRUNO SILVA . MY PHOTO
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